Revista Literária

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Quando tudo era rosa



21 de Setembro de 1997

Querido diário,
Hoje será meu último dia escrevendo nestas páginas. É (...). Vou te deixar. Esclareço logo que não é pelo computador, já que sei dos teus ciúmes e medo do meu novo presente e sinceramente também não gosto e nem sei muito como mexer neste negócio.

A verdade é que como sabe diarinho, hoje completo quinze anos e já não sou criancinha para ficar escrevendo minha vida em um diário cor de rosa. E papai finalmente me deixou namorar, então não terei mais tanto tempo para você.

Desculpa as poucas palavras é que ando um pouco apressada porque tenho que ir ao salão com mamãe, mas antes de qualquer coisa queria lhe agradecer e dizer que estará guardadinho aqui no meu armário.

25 de Maio de 2003

Estava arrumando minhas coisas forçadamente e também sem querer acabei te encontrando, por mais que se tenham passado alguns anos, virei somente uma página para escrever e sem muita inspiração para fazê-lo. Contudo, não se preocupe, para que não ocorra outra vez situação tão embaraçosa, depois deste relato, o senhor se tornará cinzas.

Nobre diário,
Estou fazendo faculdade de jornalismo, então sei que deveria começar pelo vocativo, mas penso que antes de qualquer coisa precisava de uma explicação para a minha mudança de idéia sobre você.

Diferentemente da última vez que escrevi em tuas páginas o clima aqui em casa não é dos melhores, papai resolveu finalmente investigar a fundo como eu tinha um carro melhor que o dele na garagem, jóias que mamãe nunca teve e isto porque não desconfiou das roupas, já que era claro para ele que modelos recebiam peças das grifes depois do desfile. Mas esta história toda de moda só foi sustentada até hoje, quando vi tirado no chão meu book supostamente feito por um suposto fotógrafo famoso. Naquele momento não precisou ninguém me falar nada,já tinha entendido tudo.

Não sei se vai ser melhor, pois não estou saindo da maneira que queria, no entanto já havia pensado na possibilidade de morar sozinha e se faltava um empurrãozinho, digamos que ganhei um pouco mais do que isto.

18 de fevereiro de 2010

Andei muito gripada e por mais que me remediasse, tomasse repouso ou qualquer outro tipo de medida, cada vez era atacada mais fortemente por esta doença, e então, por auxílio de uma colega resolvi fazer um exame de HIV, e agora me resta desabafar no verso deste:

Quando fiz minhas escolhas, jamais imaginei que poderiam me levar à um resultado de exame soropositivo, lógico que era possível de ocorrer mas sempre imaginamos que nunca acontecerá com nós mesmos. Pois é, enganei-me mais uma vez. O pior nem é isto, o que há de mais difícil nisto tudo é que estou completamente sozinha, uma das minhas opções foi deixar minha família e como já havia mencionado àquele não fora o meu primeiro erro. Simplesmente não vejo para onde olhar.

Por tudo isto acabei lembrando do meu antigo diário cor de rosa, pois apesar de tudo, mesmo quando não queria falar com ninguém o que me doía, ali podia desabafar em longas páginas o que sentia, o ódio bobo dos meus pais quando me colocavam de castigo, as paqueras da escola,primeio beijo, tudo. E agora querido verso de exame, como não tenho mais tanto tempo para escrever longas páginas, o que resta da minha vida, o senhor dará conta.