Revista Literária

terça-feira, 20 de maio de 2014

Ir de Regência Intransigente

Na calma dos seus olhos esverdeados pelo sol
Encontrei a surpresa na dureza de suas palavras
Descobri uma incerteza velada por cabelos negros
Em boca firme, o beijo de amor

O domínio das formações verbais são o zelo de sua morfologia
Desprotegido pelo amanhã desconhecido da semântica

O escudo é substantivo!
Destruo sem dó, que não é nota.

Você foi.

Cheiro cocaína
Grito Dora
Grito Ana
Adoro cocaína e Ana me é Dora.

Os vizinhos chamam a polícia
A polícia me prende
O sol nasceu quadrado, que é nota

Eu prendo o delegado
Que adora ler haicais em japonês

O agente te chama
Você voltou

Passividade

Sem escudo
Sem substantivo
Buscando isso em verbo
Eu faço de um amor um verbo
(...)
Um verso:


Amor.

terça-feira, 22 de abril de 2014

As Horas da Abelha

A abelha não dorme
Ela sabe.
Eu acordo
Eu sei

O sol derrete o orvalho
A abelha sente o cheiro da flor
Eu ponho água no copo
E espero a hora certa para tomar o remédio

Sento na sala, não há tv
Ligo a vitrola em Adoniram
A abelha entra
E observa com todos os olhos o rolar da agulha

O lado A acaba.

Esqueço a música e observo o jardim
Todas as minhas flores
O show de cada caule cheio de espinhos
Uma artista difícil de se acompanhar essa rosa

Ponho o lado B

A abelha balança ao som do samba
Acompanha a melodia com zumbido
Samba com as mariposas
E ouve atenta a garoa

Acaba o disco.

Vou tirar o Lp da vitrola

Meu caminhar é lento
As asas são leves e rápidas
As mão enrugada
As antenas bem ligadas

Vejo a abelha
Ela me vê
Somos um bicho
Da música e do mato

Sou zangado
Ela rainha de bateria
Ponho a mão nela
Ela sou eu

Vou voar no jardim
Ela correrá atrás do trem

Podemos e queremos a vida

Ela agulha
Tenho alergia
Vivemos um segundo

Homem e abelha.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Fotografia de Rua

O retrato em branco e preto com teu rosto colado ao meu preso em minha escrivaninha reserva um oceano de ar. Não respiramos na foto, estamos intactos, como se buscássemos naqueles sorrisos de outrora o eterno. Nosso segundo permaneceu engaiolado dentro do vidro que porta o retrato em moldura colorida. Não vejo mais cor em nós dois. Só vejo a água daquele mar em que nadamos nos meus olhos.

Lembro o momento seguinte ao flash, eu disse que te amava e você não disse nada. Olhei os teus olhos e vi o mesmo que você havia dito. Peguei o meu celular da mão do moço e fingi que não havia gostado da foto, pedi outra. Ele tirou, sorri, te dei um beijo e disse que te amava muito, você permanecia estática. Levantei correndo e fui em direção ao rapaz, pedi mais uma foto. O homem fez o que pedi, sorri, te dei um abraço e disse em teu ouvido o quanto te amava. Você era imobilidade. Levantei e você pegou firme o meu braço.

Desvencilhei-me de tua força, cai com as mãos no sapato rosa daquele senhor, olhei o desespero que se via em mim em seus olhos. Titubeei o meu levantar e meio ajoelhado e lhe pedi mais uma foto.

Voltei ao banco e estava gelado, não sorrimos para a lente. O flash deixou meus olhos revelarem o começo do desaguar do rio que estava começando a nascer dentro de mim. Vi a sua beleza tão fria quanto o cimento do banco. Levantei, e você agarrou o meu braço com força.

Olhei em teus olhos fielmente, você me pôs no banco, levantou- se, agradeceu ao homem, pegou o celular e tirou uma foto de minha tristeza. Foi em minha direção e deixou o celular  ao meu lado.


Aquela foto sozinha tornou-se o retrato da minha vida.

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Madrecita

Em minha alma,
Há um espaço adornado,
Sagrado,
No hay dolor

No começo era lágrima,
Tudo virando
Os gritos, os sonos, as palavras sem dono
El amor.

Houve a mentira
Houve a história que lhe conto
La madre de todos eses años
Se acaba de cumplir más un tanto.

Cubro a tarefa de hijo
Con lucha
Trago presentes
Mando flores
Água misturada!
Un vaso sin hielo, por favor!

Abrazo
Beso
Grito!

De desespero
De rabia
De incompreensão
De(...)

Amo a minha mãe como amo a última linha
daquela poesia jamais escrita
A impossível

Te quiero, madrecita

Estamos juntos desde o dia da criação.
Sou o reflexo sem nexo
Perdido

Desse impuro e santo coração.

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Dia

Chegada. Sorrir a beleza do belo instante.  Momento de encontro sem hora de dizer adeus. O brilho da manhã cobre as cortinas de nossos beijos em forma de Bossa Nova. As palavras que ainda não disse são todas faladas pelo nosso olhar. Uma dissertação de doutorado em piscadelas de olhos felizes. Um abraço.

Talheres. Sentamos como se nunca tivéssemos havido sentado no mesmo lugar. A rotina é dançante e os passos são cegos. A coreografia da mesa nos leva para o quarto. A janela está aberta e o seu prato vai esfriar. Calamos em respeito a refeição. A sobremesa não tem mesa. O chocolate transborda em derretidas palmas de rir.

Circo. Jogo o teu cabelo para cima, leoa. Corro do tapa forte da garra sem unha. Olho o seu ódio e gargalho no chão. Sem achar a graça, encontra o meu beijo no piso gelado e ganha um abraço apertado. O palhaço tira a meia do sapato e esfrega em seu botão. O riso é completo. A mágica das palavras do amor são ditas e a plateia aprende finalmente a bater palmas sem vergonha do vizinho que quer ouvir a televisão.

Praia. O oceano dá a maré o embalo do prelúdio do amanhã. As espumas correm lentas, procuram os relógios da areia e despejam suas algas na beira dos ponteiros. A rotina calma da água salgada é tão eterna quanto os minutos que duram os nossos últimos beijos. Sem sombra, o sol se despede e a lua governa o mar de Copacabana.

Ditadura. As estrelas se colocam todas em sua luz pequena, e a lua rouba-lhes a graça de ser o membro mais romântico do céu. Pobre Sol que nos ilumina e esquenta, a lua esfria e pede abraços. A estrela se ajoelha e o satélite ergue a ordem de chegada. A noite nos engole. O fim do dia é a brevidade do adeus e a saudade imemorável do amanhã.